terça-feira, 28 de setembro de 2010

Primeiras Reflexões sobre ONGs

Por ser um fenômeno muito recente, as ONGs ainda não são muito teorizadas. Existem vários trabalhos isolados em todo o mundo sobre sua atuação, mas nenhum ainda conseguiu abranger tudo o que realmente é uma ONG ou a sua área de atuação.
As ONGs começaram a surgir após a Segunda Guerra Mundial, em casos muito isolados, para ajudar na reconstrução da Europa e também os feridos dos combates, que foi o caso da Cruz Vermelha. Elas ficaram populares na década de 70, quando outras começaram a surgir e começou um surto de ONGs no mundo todo. As grandes ONGs como Cruz Vermelha, Anistia Internacional, ganharam repercussão nas Nações Unidas o que fortaleceu bastante sua atuação. Essas abriram filiais no mundo todo, e trabalham em parcerias com outras ONGs menores locais, principalmente as ONGs de desenvolvimento.
O despertar das ONGs na década de 70 se deu por conta de várias mudanças que ocorriam no sistema internacional na época. A Détente se embrenhava na Guerra Fria. A Europa começava a aprofundar sua integração, o sistema de Bretton Woods entrava em falência, começavam os problemas ambientais. Foi a época em que os Estados recuaram na economia e as empresas multinacionais começaram a “interferir” nas políticas domésticas, principalmente nos países desenvolvidos. O mundo vivia um momento de quebra de paradigma em todos os campos da ciência. Os avanços tecnológicos começam a surgir mudando os padrões de produção, o fordismo para o taylorismo, e a globalização do capitalismo, o que gerou uma população periférica nos setores fabris que começava a se prejudicar com essas mudanças. No Japão ocorre uma “Revolução Educacional”, quando toda a estrutura de ensino é reformada. A física descobre seu lado quântico, que quebra tudo o que se pensava antes acerca da matéria. Da mesma forma, as teorias de Relações internacionais não conseguiam mais retratar o que acontecia no cenário internacional.
Nesse contexto é que começam a surgir as ONGs. Elas começam como uma reunião de algumas pessoas que acreditam em alguma causa, e resolvem lutar por isso. Todas as transformações mundiais geraram sérias conseqüências na sociedade que se juntou para tentar melhorar alguns setores por meio de ação coletiva. Vários movimentos assim começam, mas nem todos devem ser chamados de ONG.
Da mesma forma que podem ser consideradas conseqüência dessas muitas transformações culturais, podemos dizer que também contribuíram para que esse processo se acelerasse. Com o avançar da globalização e o fortalecimento das parcerias com o governo e com outras ONGs Internacionais, em regime de cooperação internacional, criou-se uma rede de troca de informações e pesquisa que contribuiu para acelerar o processo da globalização no mundo todo. Um efeito do surgimento das ONGs é a força que a sociedade civil conseguiu através das ONGs, pois esta garantiu a sociedade melhores formas de organização para lutar por seus direitos e vontades. As ONGs de desenvolvimento foram de grande importância para este fato, pois como sua ações são em maioria para atingir a base da sociedade, garantiu que os países periféricos começassem a entrar no mundo globalizado buscando acesso as novas tecnologias, um pouco de qualificação em comunidades, mesmo que ainda de forma muito precária.
Resumidamente, as ONGs são formas institucionais de ação coletiva, não-governamental, e sem fins lucrativos que buscam o bem público. Não são instituições representativas oficiais da sociedade, estas competem ao governo, pela Constituição. Uma das dificuldades acadêmicas de teorizar o fenômeno das ONGs é que o nome é muito amplo e abrange várias instituições ou grupos que não são ONGs.
Para nos aprofundarmos em suas características, discutiremos a primeira, que está em seu nome: Organizações Não-Governamentais. Se tomarmos apenas seu nome como critério de seleção, todas as organizações que não são geridas e financiadas pelo governo seriam ONGs. Isto incluiria sindicatos, associação de moradores, movimentos sociais, grupos extremistas, grupos de narcotráfico, como o comando vermelho ou o PCC. Portanto para definir as ONGs são necessários outros critérios.
Um próximo passo é então lembrar que estas organizações não têm como objetivo final o lucro, como as empresas, são sem fins lucrativos. Embora busquem e precisem de financiamento, é o bem público, é o alcançar de um objetivo sua preocupação maior. Com esse critério já é possível excluir alguns outros grupos. Mas ainda assim alguns como escolas de samba, ou caçadores de patos continuam no nosso monte geral para as ONGs. Deve-se aprofundar mais.
Um outro corte que se pode fazer é acerca de sua representatividade. As ONGs não representam ninguém oficialmente, apenas valores ou idéias. Nem todos são favoráveis aqueles valores. E ninguém da ONG foi eleito para representar alguém. Eles são organizações privadas, de interesses privados.
Outro critério importante é que para ser considerado ONGs, um grupo deve ter certo grau de institucionalização. Assim, passeatas, movimentos sociais não podem ser considerados ONGs por não terem continuidade, lugar fixo, estruturas jurídica, para ser auditado, com contabilidade, direito trabalhistas, etc.
E por último, as ONGs buscam o bem púbico. Esse é o objetivo de suas ações. Embora existam algumas que se denominam como ONGs, seu objetivo final não é a boa ação. Isso nem sempre fica claro, principalmente por a regulação da ONGs ainda ser muito rarefeita.
Assim posto, podemos analisar então algumas áreas de atuação onde as ONGs estão envolvidas.
·         Filantropia Tradicional: a ação voltada para o bem público de grupos como Lions, Rotary, ou até mesmo de igrejas, tem um caráter de puro assistencialismo, que não cria vínculos, é uma ajuda momentânea.
·         Fundações empresariais: Estas são formadas por doações de grandes empresários que ao chegar ao fim de sua vida, resolver dar tudo  que tem para o bem público, como Rockefeller, Ford, e outros grande empresários americanos principalmente, que financiaram grandes universidades com seus testamentos. Esta ação também pode ser caracterizada como assistencialismo, por não criar vínculos.
·         ONGs Internacionais: estas são “mega ONGs” que fazem parte do conselho consultivo do ECOSOC, nas Nações Unidas. Estas são as que nasceram ao final da Segunda Guerra Mundial para a reconstrução e ajuda humanitária. Estas assim que nascem se aliam ao governo, e abrem “filiais” no mundo todo. Estas trabalham em cooperação com ONGs menores e regionais.
·         Sistema de cooperações internacionais: Podem ser públicas ou privadas, com empresas, órgãos do governo ou com ONGs Internacionais. Muitas ONGs pequenas, ou regionais, são financiadas pelos grandes países ricos e suas empresas ou grandes ONGs.
·         ONGs de Desenvolvimento: No terceiro mundo surgiram várias ONGs de Desenvolvimento, que se preocupavam com o desenvolvimento social e econômico de seus países. Esses são financiadas majoritariamente pelos sistemas de cooperação internacional.
·         Novas filantropias: ao ver que as grandes ONGs conseguiam várias formas de financiamento, surgiram várias ONGs pequenas recentemente que, embora façam pequenas filantropias, como a filantropia tradicional, buscam conseguir lucros pessoais, “desviando” dinheiro dessas organizações para projetos pessoais. Estas não são reconhecidas pelas sociedades das ONGs, a ABONG no Brasil, por exemplo. Estas se aproveitaram de um momento clientelista do governo, quando surgiram as parcerias público-privadas.
·         Responsabilidade social empresarial (RSE): Esta é a mais recente forma de assistencialismo que surgiu. Influenciadas pelo surgimento das parcerias público-privadas, as grandes empresas começaram a “cuidar” de setores que seriam responsabilidade do governo, mas que este não estava dando conta. Assim, atraídos por benefícios fiscais e (...) as empresas começaram a financiar e trabalhar junto com ONGs em questões sociais e ambientais.

Outra questão importante a ser comentada, discutida no texto de Bebbington, é que a dificuldade de se teorizar as ONGs decorre de sua própria estrutura de funcionamento. O autor acredita que os estudos acabam ficando distorcidos por serem financiados por eles próprios. A maioria dos investimentos para pesquisa das ONGs menores vem pelas redes de cooperação com a grandes ONGs internacionais, e portanto, o autor acredita que isso faça com que certos tipos de conhecimento sejam produzidos e outros não, certos argumentos sejam comentados e outros não, que certas idéias ou ações sejam expostas e outras não. As pesquisas então ficam incompletas e “manipuladas”.
Segundo o autor existem outras redes sociais existentes entre as ONGs e as sociedades onde estão que ainda não foram estudadas e merecem atenção para que se entenda como esta age como ator, na sociedade nacional e no contexto internacional. Outro problema na teorização das ONGs é que os métodos de estudo abrangem o que as ONGs dizem, e não o que realmente fazem. Assim, os estudos acabam ficando enviesados novamente, agora não pelas organizações financiadoras, mas por pessoas-chave na organização.
Ainda é importante destacar que muitos pesquisadores, acadêmicos principalmente, encontram muitas dificuldades para “entrar” no mundo das ONGs, por conta de desconfiança das organizações. Aliado a isso, o pouco incentivo acadêmico para estudo das ONGs acaba contribuindo para o estudo das mesmas.

(Por Ana Carolina Monteiro)

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